segunda-feira, dezembro 20, 2010

Na Calada Da Noite

Estou escrevendo este texto no avião. Indo de Curitiba ao Rio. Já perdi a conta de quantas vezes eu cruzei as fronteiras imaginarias pelo céu. A terceira vez que cheguei a Mut Mee, minha casa em Nong Khai na fronteira da Tailandia com o Laos depois de ter dado a volta pelo sudeste asiatico, cheguei de madrugada. Tudo estava fechado. Entrei, e sentei nas grandes mesas cobertas por telhados de sape. Fiquei incrivelmente feliz ali. De volta. Lembro de pensar no livro da Liz Gilbert, na sua chegada ao Ashram na India, bem no meio da noite quase de madrugada. Lembro dela explicar, que seu avo dizia que uma galinha para ser aceita no galinheiro, tinha que ser assim, colocada no meio da noite. Dessa maneira quando todas as galinhas acordassem era como se a nova galinha nunca tivesse partido. Pensei isso aquele dia. Pensei isso todas as vezes que cheguei em algum lugar assim, de mansinho, aos pouquinhos.

Foi meio assim minha chegada a sao Paulo dia 26 de novembro. Cheguei e fiquei quietinha, sem ligar para ninguem, porque nesse ano como nos ultimos vim para visitar a famosa “maquina”. Fui fazer meu exame de ressonancia, e dessa vez tão tranquila, ou quem sabe tao cansada, até adormeci dentro da maquina de ressonancia magnetica. E fiquei mais uma semana meio quieta esperando par air la correndo e fazer o que eu sempre faço, pegar o meu exame, e abri-lo, e procurar a unica coisa que faz sentido para meus olhos nao medicos. A conclusao. E mais uma vez ela dizia: “nenhuma nova alteração”. E eu chorei como sempre choro na percepção da fragilidade e da força da vida.

Alguns dias depois da minha chegada minha mãe me convidou para ir com ela a AACD onde ela voluntaria ja faz alguns anos. Ela sempre conta as estórias, e quando eu meio que ameaço ficar um pouco emocionada ela explica. “Não precisa ficar emocionada, a AACD é um lugar muito alegre! As crianças riem muito”. Eu fico tocada quando minha mãe diz isso. De fato, muito do sofrimento que vemos está nos nossos olhos. Nem sempre dificuldade é sinonimo de tristreza. Então que quando eu fui com ela a AACD, cheguei la do meu jeito. De mansinho, observando de longe com cuidado… fui me apaixonando pela professora uma mulher excepcional, que da aulas para 35 criancas de 5 anos de manha numa escola da prefeitura, e a tarde na AACD. A vivacidade, a alegria, o empenho, a dedicação são totalmente comoventes. A professora, faz de um tudo, compra coisas do seu proprio dinheiro, livros, estorias, faz fotografias, e aqueles alunos de fato são alegres, e apaixonados por ela. Minha mãe tem razão não é um lugar triste. São muitas e muitas risadas.

Depois disso eu fui parar em Curitiba, com uma prima que eu so realmente conheci ao vivo em junho. É incrivel como podemos nos conectar tanto com alguem em tão pouco tempo. Eu, já expliquei aqui um milhão de vezes que não sou nacionalista. Eu também nao sou parcial. Nao gosto de alguem so porque é da minha familia. Raramente tenho esse sentimentos que ligações de sangue importem muito. Acho que contruismo os nossos relacionamentos, e que vamos escolhendo pessoas que admiramos para respeitar e admirar. E essa minha prima apareceu assim, para dividir coisas de alma.

Com ela vim a Lapinha, um spa no parana. Um lugar lindo. Um lugar tranquilo. Um lugar verde. Organico. Não é um spa tipico. As pessoas que estao la nao sao obsessivas com emagrecer. Nao. A lapinha é cheia de pessoas que estão voltando lá para descansar, para se acalmar, algumas até para engordar. É tudo tranquilo, tudo num clima bem de paz. E ali eu fiz muitos amigos, e conheci pessoas realmente incriveis e eu pude “reconhecer” a minha prima, porque conhecer eu ja devia conhecer em algum lugar da alma, em alguma outra dimensao, em alguma outra coisa bem pouco racionalizavel.. E hoje eu saí de lá assim, bem cedo, bem de madrugada para que quando amanhaecesse fosse como se eu nunca tivesse partido, nunca tivesse estado.

Eu acordei e no silencio da noite sentei com minha prima no pequeno sofa, mal concebendo como a vida pode trazer alguem a sua vida assim. Alguem que nao existia na sua vida e de repente a vida é impensavel sem a existencia daquela pessoa. Parece que ela sempre esteve la. E eu sentei ali, tao grata, tao tocada, tao feliz, tao dificil, tao cheia de sentimentos, tao emocionada. Entao, foi bom sair bem assim dentro da madrugada. Dirigir no silencio da noite, torcendo para o taxista falar pouco porque qualquer conversar casual é meio que profanar aquele momento tão puro, tao cheio de emoção. Só consegui partir da Mut Mee tambem assim, sem dizer adeus a ninguem. Porque nessa vida de cruzar tantas fronteiras, eu vivo tendo que dizer adeus. E quando sou eu que parto é mais fácil ir assim na calada da noite.

ps: escrito dia 17/12

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