Conheci uma pintora esses dias. Uma pintora Iraniana. "Pintora mesmo!" meu amigo me disse ao apresentá-la. Irã que para mim é tão querido, por seus filmes, historia, e pelas pessoas que eu conheci de la. Uma delas, em particular, que me faz muita falta é a minha amiga Sara.
Conheci a Sara, anos atrás quando eu ainda morava e estudava em NY. Se eu nao me engano, foi dentro de um trem, eu conversava em francês com minha roomate, e ela nos abordou pois adorava francês. Por coincidência, estudávamos na mesma faculdade, ela jornalismo e francês, e eu cinema e musica. Hoje ela volta a Columbia para estudar cinema, e eu que me formei em antropologia e politica Internacional, vou me meter na área de antropologia do aprendizado e da cognição, aqui em Londres na LSE.
Não demorou nada para eu me apaixonar por aqueles olhos azuis cor de piscina e toda aquela intensidade Iraniana. E em pouco tempo ficamos muito amigas. Junto de uma americana de igual sensibilidade, e uma chinesa de total leveza formamos um grupo de encontros. Fazíamos diversos jantares, que terminavam em infidáveis conversas que se passavam em todos os continentes.
Me lembro perfeitamente, de quando a Sara nos contou de sua saída e volta ao Iran. A revolução já tinha acontecido, a Sara ainda criança, lembrava de homens com armas fora do portão de casa. Ela ja não podia brincar na rua, e a família ia sobrevivendo como podia. Um dia, se nenhum aviso, a mãe a acordou e disse que eles estavam indo embora.Ela não sabia para onde, e provavelmente nem porque. Saíram, assim como muitos outros, fugidos, carregando o que podiam e se tornaram umas das muitas famílias Iranianas espalhadas pelo mundo.
Depois de muitos anos, voltou. E a casa ainda estava la. Igualzinha. Tudo no mesmo lugar, a cama desarrumada, os objetos no chão, o dinheiro já sem valor na parede. O mundo ruíra la fora, na casa tudo continuava o mesmo, com um pouco de poeira, mas tudo no mesmo lugar. Ela não, ela já não podia viver mais lá.
Eu nunca vou me esquecer da intensidade daquele momento, de entrar assim na memoria de uma outra pessoa, de enxergar as rugas no lençol. De por um segundo dividir um mundo a parte, num momento tao forte como o de ser expulso da sua própria casa.
E nesses 60 anos de Israel, eu tenho que pensar nisso. Na violência que é arrancar alguem do seu lugar. Não só do seu lugar físico que para um materialista representa a base da cultura, mas de arrancar alguem do seu lugar social. Lugar onde a pessoa se define por suas relações. Mais difícil ainda é para os que nascem nesse "limbo" ( fora do lugar de onde se julgam de origem), presos entre a idéia de uma passado perfeito e inexistente, e um presente inaceitável.
Eu e a pintora, trocamos e-mails, eu vi seus quadros e me encantei. E ela me escreveu naquela intensidade da Sara de quem aprecia os pequenos momentos do dia. No meio do e-mail me perguntou, quanto tempo eu ficaria em Londres. Se eu estava de passagem. E eu entendi, pois tendo morado em muitos países também sinto o mesmo medo. Medo de ser arrancada da minha casa, não da casa física, mas da social. Dessa que me define como pessoa. Ser arrancada e levada para um outro lugar onde de repente sou menos. Sem relação com o outro acabamos não sendo ninguém.
Um comentário:
Onde andarás!!!!???
Pelo mundo!!!
Saúde e força sempre !!!!
ÔM Jay Julieta!!!!
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