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Quando eu estudava em NY, minha grande amiga e ex-roomate Joss tinha uma teoria que ela avaliava todo semestre. Segundo ela, não importava quão distintas fossem as aulas que ela escolhesse para o semestre, em algum ponto todas elas se encontravam num tema em comum. Nunca soube direito se as coisas são todas realmente conectadas, ou se como dizia Joao Carlos, meu professor de comunicação e arte, é por causa do nosso repertório que podemos conectar e apreciar coisas mais ou menos. Depois de ser casada com um neurocientista tbm passei a pensar no famoso repertório do JC como bases para redes neurológicas, que se conectam como podem de acordo com as informações que temos. Há dias em que o meu ateísmo e ceticismo são fortes e as explicações evolutivas e neurológicas são mais do que suficientes para explicar essas conexões. Noutros, no entanto, uso essas redes cerebrais para conectar a noção de sincronicidade de Jung, com a de conectividade dos místicos, e as divagações ( que eu não posso avaliar os fundamentos) dos quânticos. No fim, nunca soube de fato o porque desses encontros, mas nunca pude deixar de aceitar que a Joss tinha razão, eles sempre acontecem.
E esse ponto aconteceu para mim ontem, enquanto assisitia ao show do Paco de Lucia aqui em Londres. Ou melhor, aconteceu depois, depois que eu deixei a companhia de amigos com quem assisti ao show. Depois que pensei um pouco mais sobre nossa conversa.
No começo do show, o violão do paco trastejou, umas notas não sairam... e eu fiquei prestando atenção muita atenção nessas falhas. Prestei atenção na emoção que o senhor ao meu lado sentia ao ver ali, obviamente, o seu ídolo. Prestei atenção nos espanhóis que gritavam Maestro, nas pessoas que gravavam e tiravam fotos, em suma em tudo menos naquele momento. Na segunda parte do show, eu parei, parei de olhar a volta, parei tudo e senti a música. Como sempre fui arrebatada por uma emoção inexplicável.
Na saída do show, encontrei meus amigos, um como eu tinha prestado total atenção nas notas não tocadas. O outro, grande fã do Paco, as tinha notado mas quase nada tinham significado para ele. O tempo, disse ele, esteve sempre correto, as mãos inexplicáveis... A emoção que ele sentiu, vinha de estar em frente ao Paco, de ouvi-lo.
E só quando eu voltei para casa, pensando, eu entendi aquele momento. A dicotomia entre emoção e o criticismo. Percebi que todas as vezes que me deixo levar pela completa emoção de estar diante de alguém que admiro, me parece que eu tento policiar o meu senso critico, medo talvez de encontrar uma falha e não poder mais admirar. Por outro lado, quando esse senso se alimenta de si mesmo, eu acabo inevitavelmente perdendo o significado do momento. O problema, eu percebo, não é no senso crítico em si, ou na emoção, mas sim nessa idéia de que uma coisa tem que ser perfeita em um todo. Meu amigo tem razão, e daí que trastejou, o Paco é fenomenal.