quarta-feira, janeiro 26, 2011

Circulos

Quando eu fui para Israel em Setembro fiquei na casa do Netanel em Jerusalem. ELe, que é guia turistico, teve a paciencia de me contar 4000 anos de historia em uma longa caminhada. Passou dias comigo me mostrando todos os detalhes de Jerusalem. Eu, como já deve ter ficado bem claro, presto mais atenção em gente, do que predios. Então enquanto eu ouvia atentamente ao meu guia privado, especialista em todos os segredos historicos e arqeuologicos de Jerusalem, eu secretamente me distraia olhando os ortodoxos com seus chapeus, os Cristãos alugando suas cruzes, as mulheres e suas perucas, as crianças que corriam, os homens arabes tomando seus chá sentados numa mesa qualquer numa daquelas milhares de ruelas.

Eu olhava para o que ele me explicava, eu prestava atencao; no entanto, o que me chocava, e entretia sempre mais era imaginar que por aqueles milhares de anos as pessoas andavam naquelas ruelas, que o chao é marcado dos passos, de milhares de pessoas com milhares de duvidas existenciais, certezas religiosas, preocupações mundanas sempre carregadas nas pernas dessas pessoas.... sempre ficando ali no chao daquela cidade que se pudesse falar faria tão pouco sentido como faz sendo vista.

Netanel me levou aos mercados, aos lugares secretos, a econtros do couch surfing, me contou as lendas, as historias, cozinhou para mim, me explicou os caminhos todas as vezes que eu ligava perdida. Falamos de viajantes, do gato, da mae, de musica da irmã. Um pouco sobre o exerctio... bem pouco porque quando eu fiquei na casa de Netanel eu ja tava meio que emocionalmente exausta. Combinando a personalidade reservada dele, a minha exaustao quanto a questões tao emocionais como a questão Palestina na minha estadia em sua casa nos nunca falamos nada sobre isso.

E agora aqui em Londres, em meio ao turbilhão de mudanças, perguntas sobre que caminho seguir, como é que eu recomeço, faço doutorado, largo doutorado? Mudo de volta para o Brasil, vou para Romenia, para a Tailandia? eu recebi esses dias aqui em casa o Netanel. Fazia 4 meses que não nos viamos. E a chegada dele trouxe um pouco de calma... afinal não dá para ficar deprimida com um visitante. Não to querendo contrariar os gregos :)

Netanel foi nosso primeiro Couch Surfer nessa casa. Foi incrivel. Incrivel como sempre é. Eu fui sem dúvida pior anfitriã e pior hóspede do que ele.... que ja chegou trazendo alento, zatar e canela de Jerusalem. Chegou ja cozinhando. Chegou de mansinho, ficou bem quietinho. Eu nao pude contar a historia de nada pq eu nao sei a historia de nada. Eu tava mais para calada considerando as circusntancias.

Ontem a noite no entanto, no nosso ultimo jantar que ele cozinhou para todos nós propus que fizessemos o ritual da minha despedida. Dessa vez o bastião da fala foi um "nao sei como se chama" budista. Como um prayer bell daqueles de girar com a escritura dentro. Quem começou foi a Iva agradecendo a vinda de Netanel. Agradecendo por aprender sobre esse jeito de viajar sem sair de casa. Eu não vou falar do que todo mundo falou pois levaria muito tempo. Como sempre foi bonito.

Agora o que me tocou mesmo foi o que Netanel contou. Netanel que nao é um ativista me contou que ele já tinha estado na Palestina como soldado. Tinha estado carregando fuzil, com as costas na parede e com medo. Que faz 2 semanas organizou um grupo de couchsurfing para ir a Palestina. Foi pela primeira vez como civil. Entrou no campo de refugiados. Conversou em broken arabic. Quando disse que era Judeu foi tratado com total surpresa. Depois que voltou para Jerusalem recebeu um palestino em sua casa. Um couchsurfer. Contou das conversas. E conclui dizendo:

"Antes de eu ir, eu achava que para melhorar a situacao a Palestina precisava ser melhorada materialmente. A situacao la é terrivel. Eu achava que o principal para vivermos em paz era que eles pudessem melhorar economicamente. Agora que eu fui la, sem fuzil, sem estar com as costas na parede eu sei que isso não é o suficiente. É importante mas não é o suficiente. Agora eu sei que a unica coisa que realmente pode nos levar a paz é contato."

Meus olhos se encheram de lágrimas. Assim como se enchem agora. Esses dias eu vi um TED talk onde uma escritora turca começava contando que foi criada pela mae secular, e a avó muito mistica. A avó, ela explicou, sempre recebia pessoas que vinham benzer suas verrugas e marcas na pele. A avó benzia e fazia um circulo com uma caneta a volta da marca. Os pacientes voltavam com as marcas desaparecidas. A autora explicou que dizia a avó que se intrigava com o poder da fé. A avó então disse a neta " Sem duvida a fe move montanhas, mas nao se esqueça do poder dos circulos. Tudo que vc fecha em um circulo, rodeia acaba se destruindo,se consumindo... desaparece"

Ouvindo o meu amigo que não é um ativista sair do seu circulo para encontrar o outro de outra cultura me toca. Não é necessario abandonar a sua identidade para encontrar o outro. Agora ficar só no seu grupo, no seu circulo é bem perigoso. Eu concordo com a autora turca que fala do poder das estórias. Estória nos levam a conhecer o outro. E como vcs bem sabe eu acredito no poder dos encontros. Encontro, amor e compaixão são realmente as unicas coisas verdadeiramente subversivas.

2 comentários:

Mag disse...

Ju,
Seus posts são sempre marcados por uma sensibilidade incrível.
Linda história!
bjos

Julieta de Toledo Piza Falavina disse...

Oi Mag,

Muito obrigada pela sua mensagem!

ju