sexta-feira, junho 03, 2011

Aulas

Alguns meses atras eu me inscrevi para ser seminar leader de um curso da Birkbeck. Havia tres opcoes Pyschological Approaches to Social Conflict, Sociological Approaches to Social COnflict e Political Approaches to Social Conflict. Achei que seria muito dificil me chamarem afinal eu nem terminei ( e agora nem vou terminar ) meu doutorado. No entanto, achei que se me chamassem, seria para uma das duas primeiras aulas.... como a vida sempre surpreende eis que me chamaram para a aula de politca.

No comeco fiquei meio insegura afinal de contas, apesar de eu ter feito um monte de aulas de ciencia politica e politica internacional essa nao eh minha especialidade. Encontrei com o professor que na verdade eh da SOAS e quando vi o syllabus fiquei bem tranquila. Os topicos eram liberalismo, feminismo, Marxismo etc. E como a classe era para undergrad nao havia nada de muito complicado.

Alem disso, a unica coisa que eu tinha que fazer era guiar o seminario depois deles terem visto a aula. Em outras palavras faze-los falar sobre o que eles tinham aprendido. Tanto eu como o Kevin estamos muito mais interessados em saber o que essas pessoas pensam depois de ter ouvido o que pensava Stuart Mill, our Marx do que te-los repetirem o que os famosos e debatidos pensadores pensam ou nao.

Na Birkbeck ha muitos alunos que ja sao mais velhos. Eu nunca na minha vida imaginei que eu fosse ficar tao interessada, e tao fascinada pelas discussoes que eu fomento toda terca-feira, e quarta a noite.

Alem dos alunos serem mais velhos eles tbm vem de tudo que eh lugar no mundo. Ha muitas mulheres africanas no meu grupo e elas tem sido uma verdadeira fonte de aprendizado. Acho que quem ele esse Blog deve ter uma ideia que eu nao sou muito a favor do total relativismo cultural, mas tao pouco assino embaixo do universalismo com apolitico. Essa aula tem sido incrivel por isso.

Semana passada o topico que sempre aparece nas minhas aulas de faculdade nos eua, na holanda, aqui apareceu: circunzicao feminina. Nas minhas aulas eu li muito sobre isso mas nunca tinha tido representantes circuncizadas presentes. E eis que a conversa comeca de cara com uma mulher nos seus 40 dizendo que era circuncizada sim e com muito orgulho.

Eu comeco sempre explicando o que eu acredito mesmo: que quanto mais eu viajo mais parecidos eu acho que somos, e cada vez mais eu me humildeco ( existe?) com a generosidade e sabedorias das pessoas de lugares que eu nao compreendo muito bem. Perguntei entao: Porque ela se sentia orgulhosa

" Por que eu me sinto bonita!"

De todas as respostas do mundo essa era a ultima que eu imaginava escutar. Uma africana do outro lado da sala gritou.

" Mas voce foi forcada a fazer isso, agora tem mesmo que achar bonito!"

" Imagina, eu tinha 17 anos fui porque quis!"

Eu ponderei e contei a elas o caso de uma amiga minha muito bonita que ja fez nao sei quantas plasticas no brasil para se sentir bonita. Varias anestesias desnecessarias, alergias a medicamentos... mas ela sempre me explica que faz por que quer.

Ponderei que sempre que achamos que temos uma escolha temos que parar e pensar " Se eu nao fizer isso minha vida na sociedade vai ser mais dificil? vai ser mais dificil de casar, ter namorados? arrumar emprego etc etc etc?" e eh claro que ha niveis, mas se a resposta for sim, provavelmente quer dizer que isso nao eh tanto uma escolha, mas mais uma pratica a qual fomos socializados e acreditamos estar escolhendo. Mais ou menos como usar roupa.

A mesma mulher que tinha se oposto a circuncisao gritou " voce acha que escolhe, mas eh porque todo mundo faz na sua sociedade"

E entao uma mulher muito quieta la do fundo da sala disse " No meu pais, a circuncisao foi proibida e sabe o que nos meninas fazemos? Nos viajamos para Burkina Faso e fazemos la!"

Os europeus da sala ficaram de queixo caido. Uma outra mulher ainda tentou " acho que isso tem a ver com o fato que mulher ter prazer eh tabu"

Ao que a primeira respondeu " Eu tenho muito prazer! Quem sao voces para decidir como eh que eu sinto prazer e experiencio amor?" disse e deu uma gargalhada.

Toda quarta feira agora eh assim. Tudo que eu aprendi de ler de em etnografia eu to podendo verificar first hand :) E como eh fascinante ver que somos tao parecidos and yet tao diferentes.

ps: da proxima vez eu prometo que falo sobre a discussao sobre feminismo e poligamia.

3 comentários:

Carlos disse...

Achei essa discussao muito interessante, porque nao conseguia imaginar uma mulher com acesso a informacao defendendo a circuncisao. Depois de assistir a flor do deserto, comecei a procurar algo sobre isso e os relatos que encontrei sempre envolviam muito sofrimento.

Abraco.

Anônimo disse...

Ju,

sabe que eu tive uma experiencia muito parecida no Quenia! As pessoas normalmente substiman o poder da tradicao....

Saudade de vc! Amei seus emails de Israel e da Palestina!

Vc tem que escrever um livro!!

Bjs
Carol

Paula G disse...

OMG! isso é muito muito novo pra mim. esse papo de que queo mesmo e faço mesmo. afinal, quema gente pensa que ta defendendo quando empunha uma causa de uma cultura outra, taking for granted que aquilo é universalmente melhor? mas sério, que coisa doida, pq afinal retirar a maior fonte de prazer de uma mulher não pode ser uma coisa boa... que confusão de social-pessoal-físico-particular-genérico.
bom demais o papo.
beijo e saudade!